domingo, outubro 09, 2005

LavourArcaica (de Luiz Fernando Carvalho, 2001)
Existem certos filmes que exigem do espectador uma devoção quase religiosa. São os filmes "ame ou odeie", é impossível ser indiferente. LavourArcaica é certamente um deles. Além de ser uma intrigante adaptação da excelente obra de Raduan Nassar. O filme, assim como o livro, se constrói pelas contradições: o claro x o escuro, a luz x a sombra, a doença x o prazer, a peste x a cura, a família x o indivíduo, o desejo x a culpa. É claro que em alguns momentos o diretor e roteirista Luiz Fernando Carvalho chega a exagerar, como na teatralidade de alguns do dialógos e na própria intensidade das falas (que funcionam na literatura, mas que no cinema arranham a naturalidade da interpretação). Mas para o espectador devoto é preciso passar por cima disso para apreciar as belíssimas imagens e a fotografia inspirada de Walter Carvalho. O próprio Luiz Fernando Carvalho é certamente um diretor extremamente visual. Mesmo que seja a palavra o aspecto que sustenta as relações da família (e é por isso muito adequado que Ana não tenha fala alguma durante o filme todo), são as imagens que arrebatam o espectador: os detalhes das paredes, as nuvens do céu, cada esforço mínimo da direção de arte e cada centavo do orçamento aparecem na tela. As experiências dos personagens (vivos, e não representados) vêm de dentro para fora, elas surgem como a fúria pestilenta de pessoas reais de carne e osso. E isso, claro, é fruto de interpretações inspiradas de toda o elenco, e mesmo Selton Mello (irregular no papel principal) tem momentos brilhantes, como no monólogo na igrejinha. Os impecáveis Raul Cortez e Simone Spoladore são forças da natureza em formas bem diferentes: ele representa o pai austero justamente através do discurso e das parábolas; ela surge muda, mas incandescente. Nota: A+
LavourArcaica é um filme obrigatório. Mesmo para aqueles que dirão que o filme é chato e pretensioso. Na edição recém chegada às locadoras brasileiras, há um documentário muito interessante (e que segue a linha "hermética" do próprio filme) que ajuda a entender melhor as razões do diretor Luiz Fernando Carvalho nas suas escolhas, desde as locações aos detalhes da interpretação do elenco. Para os devotos, ler o livro de Raduan Nassar e comprar a trilha sonora composta por Marco Antônio Guimarães são requisitos fundamentais para entender ainda mais a obra amada.

8 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Eu preferia lascas de bambu sob as a unhas a precisar rever esta obra-prima do Luiz Fernando Carvalho. (Isidoro)

11:28 PM  
Blogger Isabela Vieira said...

Uma questão de gosto, meu caro. Mas tudo bem, eu já sabia disso. Tu fica com os teus zumbis e eu fico com o Lavoura Arcaica.

11:24 AM  
Anonymous Anônimo said...

Corta essa, baby. Eu também gosto de filmes "profundos". E não tente desfazer os meus zumbis. (Isidoro)

7:07 PM  
Blogger Isabela Vieira said...

Ih... quem falou em filme "profundo"?

1:02 PM  
Anonymous Anônimo said...

Digo, "herméticos". Pensando bem, vou seguir com o meu George Romero.

7:06 PM  
Anonymous Anônimo said...

Luiz Fernando Carvalho não foi pretensioso. Foi sim ousado e autêntico. Lavoura é a obra-prima do cinema nacional.

4:51 PM  
Blogger Isabela Vieira said...

Flavia, só se é ousado e autêntico quem tem pretensão de sê-lo. Não é nenhuma vergonha ou defeito ser pretensioso, tudo depende do resultado final.

2:54 AM  
Blogger Leco said...

"Luiz Fernando Carvalho chega a exagerar, como na teatralidade de alguns do dialógos e na própria intensidade das falas (que funcionam na literatura, mas que no cinema arranham a naturalidade da interpretação)."

Este é o único escorregão do filme, em minha opinião. Mas que filme belíssimo! E que presente é termos Juliana Carneiro da Cunha!

7:56 PM  

Postar um comentário

<< Home